Depressão
em indivíduos com lesão traumática de medula espinhal com úlcera
por pressão
INTRODUÇÃO
As
lesões medulares são cada vez mais frequentes, em decorrência,
principalmente, do aumento da violência em urbana.
Os
acidentes de trânsito e os ferimentos por arma de fogo são suas
causas mais comuns.
O
traumatismo da medula pode resultar em alterações das funções
motora, sensitiva e autônoma, implicando perda parcial ou total dos
movimentos voluntários ou da sensibilidade (tátil, dolorosa e
profunda) em membros superiores e/ou inferiores e alterações no
funcionamento dos sistemas urinário, intestinal, respiratório,
circulatório, sexual e reprodutivo1.
É
importante ressaltar que o trauma raquimedular por si só é um fator
de risco para o desenvolvimento de úlcera por pressão, em
decorrência das várias alterações sensitivas e motoras que o
acompanham.
No
entanto, podemos supor que, em pessoas que apresentam paraplegia, o
auto cuidado poderia ser realizado com maior facilidade e
independência2.
As
úlceras por pressão representam um acréscimo no sofrimento físico
e emocional dos pacientes, aumentando o tempo de internação,
reduzindo sua autoestima e influenciando na autoimagem e na qualidade
de vida.
Tudo
isso faz aumentar a depressão.
Por
isso, esses pacientes merecem toda a atenção por parte da equipe
multiprofissional, buscando prevenir seu aparecimento ou favorecer
seu tratamento3.
As
lesões medulares, em razão de sua gravidade e irreversibilidade,
exigem um programa de reabilitação longo e que, na maioria das
vezes, não leva à cura, mas auxilia na adaptação a uma nova vida.
As
sequelas e as dificuldades que essas pessoas enfrentam para retornar
a sua vida familiar, às atividades de lazer e ao círculo social
interferem em sua qualidade de vida.
Prestar
cuidados a esses pacientes é um desafio aos profissionais de um
programa de reabilitação4-7.
A
depressão é considerada uma das 10 principais causas de
incapacitação no mundo, limitando as atividades físicas, pessoais
e sociais, podendo se manifestar em qualquer pessoa, a qualquer hora
e em qualquer idade.
A
depressão frequentemente interfere no dia a dia, causando sofrimento
não somente para quem tem o problema mas também para aqueles que
convivem com essa pessoa que sofre8.
As
pessoas em estado depressivo são bastante estigmatizadas pela
sociedade e somente pequena parte delas recebe tratamento apropriado.
O
modo como a população identifica os sintomas de depressão e as
crenças sobre sua etiologia podem influenciar o processo de procura
de ajuda, a adesão aos tratamentos, bem como a atitude e o
comportamento da comunidade em relação às pessoas com esse
transtorno9.
Diante
da relevância dessa problemática, este estudo poderá contribuir
para a produção do conhecimento e para a possibilidade do
desenvolvimento de plano de assistência mais adequado à realidade
dos pacientes com lesão medular que têm úlcera por pressão.
O
objetivo deste estudo foi avaliar o nível de depressão em
indivíduos com lesões medulares com úlcera por pressão.
MÉTODO
Este
é um estudo exploratório, descritivo e analítico, do qual
participaram 50 pacientes com lesão medular com úlcera por pressão.
Foram
incluídos no estudo todos os pacientes adultos com lesão medular
lombar e dorsal, conscientes, orientados, que estavam sendo tratados
no ambulatório de estomaterapia, clínica médica, cirúrgica e
ortopédica do Conjunto Hospitalar de Sorocaba.
O
estudo foi realizado no período entre fevereiro de 2010 e maio de
2011, após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
Universidade Federal de São Paulo, sob o parecer nº 0032/2010.
Foram
excluídos do estudo indivíduos com lesão na região cervical e os
que não tinham úlcera por pressão.
Foi
utilizado um instrumento de coleta de dados que possuía informações
sociodemográficas, dados sobre a lesão medular e sobre a úlcera
por pressão.
Para
a avaliação da depressão, foi utilizado o Inventário de Depressão
de Beck, desenvolvido na década de 1960, o qual foi traduzido e
validado no Brasil.
Esse
inventário possui 21 categorias de sintomas e atitudes
características das manifestações de depressão e envolve
manifestações de humor, vegetativas, sociais, cognitivas e de
irritabilidade9,10.
Cada
categoria consiste em uma série de quatro graus diferentes de
intensidade da manifestação (0 a 3 pontos), totalizando 63 pontos.
Neste
estudo, foram considerados os seguintes escores: < 9 correspondeu
a sem depressão ou depressão mínima; de 10 a 18, depressão leve a
moderada; de 19 a 29, depressão moderada a grave; e de 30 a 63,
depressão grave10.
Foram
utilizados para a análise estatística o teste t de Student e
qui-quadrado de independência (P < 0,05).
RESULTADOS
Entre
os 50 pacientes avaliados, 40 (80%) eram do sexo masculino, 32 (64%)
tinham idade entre 21 anos e 30 anos, 34 (68%) não tinham ocupação,
29 (58%) eram casados ou em união estável e 31 (62%) não
praticavam atividades desportivas (Tabela
1).
Dezoito
(36%) pacientes foram vítimas de acidente de trânsito e 22 (44%),
de arma de fogo.
Em
26 (52%) pacientes, o nível da lesão medular foi na região lombar
(Tabela
2).
Com
relação ao tempo de lesão medular, 10 (20%) pacientes apresentavam
a lesão havia 2 anos e 9 (18%), 5 anos.
Quanto
às complicações, 50 (100%) pacientes tinham intestino ou bexiga
neurogênicos.
Com
relação à categoria/estágio da úlcera por pressão, 23 (46%)
pacientes eram da categoria/estágio III e 18 (36%),
categoria/estágio II. Trinta (60%) úlceras por pressão tinham
presença de exsudato e odor.
Na
Tabela
3, observa-se que 25 (50%) pacientes não apresentaram depressão
e 14 (28%) tiveram depressão leve a moderada.
Pode-se
verificar, na Tabela
4, que 48 (96%) pacientes apresentaram como sintoma de depressão
a distorção da imagem corporal; 48 (96%), ideia suicida; 31 (62%),
autodepreciação; e 30 (60%), retração social.
DISCUSSÃO
O
número de pessoas que sofrem de lesão medular aumentou
consideravelmente nos últimos anos, estando essa situação
relacionada ao nível de desenvolvimento dos países.
Sua
etiologia está predominantemente ligada a acidentes com veículos
motores, pessoas jovens e do gênero masculino11.
Esse
tipo de lesão é uma situação que surge de forma súbita e
inesperada, significando uma experiência nova, assustadora para a
pessoa, o que origina sentimentos de perda em todas as esferas da
vida e alterações do esquema corporal7.
Neste
estudo, a maioria dos indivíduos era do gênero masculino, sem
ocupação e casados ou em união estável.
Com
relação à faixa etária, a maioria dos indivíduos tinha idade
entre 21 anos e 30 anos e não praticava atividades desportivas.
Esses
achados apresentam similaridade com outros estudos nacionais e
internacionais12-14.
As
atividades desportivas nos indivíduos com lesão medular têm os
seguintes benefícios: melhora do consumo de oxigênio (VO2máx.),
ganho de capacidade aeróbica, redução do risco de doenças
cardiovasculares e de infecções respiratórias, diminuição da
incidência de complicações médicas (infecções urinárias,
escaras e infecções renais), redução de hospitalizações,
aumento da expectativa de vida, aumento dos níveis de integração
comunitária, auxílio no enfrentamento da deficiência,
favorecimento da independência, melhora da autoimagem e da
autoestima, satisfação com a vida e diminuição da probabilidade
de sofrer distúrbios psicológicos15,16.
Alguns
estudos destacam que a atividade física regular está associada a
aumento do status funcional e a melhoria da qualidade de vida de
pessoas com deficiência.
Os
autores salientam que a prática de atividade física regular previne
doenças, promove a saúde e mantém a independência funcional17,18.
Quanto
ao tipo de acidente, a maioria dos pacientes foi vítima de acidentes
de trânsito, seguidos por ferimentos por arma de fogo, corroborando
a literatura específica quanto às causas apontadas, embora existam
pequenas variações13,17,18.
No
Brasil, 130 mil indivíduos são portadores de lesão medular, com
aumento anual da incidência, decorrente do aumento da urbanização
em todo seu território13.
Os
sintomas e as complicações ocorrem de acordo com o nível da lesão,
a extensão e o tempo do acometimento, com possíveis mudanças nas
funções fisiológicas representadas por alterações respiratórias,
vasculares, urinárias, intestinais, musculoesqueléticas e úlceras
por pressão1,19.
Além
do dano sensitivo e motor, a lesão medular leva também a alterações
nas eliminações urinária e fecal, em razão da perda dos controles
esfincterianos vesical e anal, com consequente mudança no padrão
dessas eliminações.
A
impossibilidade do controle esfincteriano vesical traz vários
problemas para o paciente, entre eles a não aceitação social, a
limitação do programa de reabilitação e complicações clínicas,
como infecções urinárias, litíases vesicais e hidronefrose,
incontinência fecal ou dificuldade de conter as fezes dentro do reto
por falha esfincteriana, e constipação ou demora para eliminação
fecal, causando desconforto, além de outros distúrbios
neurogênicos12.
No
que se refere à úlcera por pressão, 46% dos pacientes apresentaram
úlcera categoria/estágio III e 36%, categoria/estágio II.
Tais
achados coincidem com os de vários autores nacionais e
internacionais20-22.
Úlceras
por pressão são complicações graves, porém frequentes, em
pacientes com lesão medular e interferem direta ou indiretamente na
qualidade de vida destes.
A
cura da lesão de pele, quando em estágios III e IV, demanda, na
maioria das vezes, frequentes atendimentos nos serviços de saúde
(ambulatórios, hospitais, clínicas ou tratamento em casa com
profissional competente) para curativos ou procedimentos
reparadores23,24.
Como
relatado anteriormente, o trauma medular constitui fatalidade de
grande proporção ao ser humano, pois, além do problema físico e
de locomoção, obriga a pessoa a mudanças e a adaptações nos
diversos papéis e atividades que desenvolvia, além de acarretar
perda de independência e isolamento tanto social como familiar.
Tal
fato tem como consequência alteração da qualidade de vida, da
autoestima e da autoimagem, isolamento social e familiar, dor e
incapacidade funcional associados a ansiedade e depressão11,25,26.
A
lesão da medula espinhal é um trauma de impacto físico,
psicológico e social ao indivíduo, sendo considerada uma das mais
graves e devastadoras síndromes incapacitantes que podem atingir o
ser humano, pois causa prejuízo a uma série de funções, dentre
elas a locomoção27.
As
consequências debilitantes da lesão da medula espinhal
frequentemente levam a comprometimento da habilidade de realizar as
atividades diárias e limitam as funções de mobilidade e
participação na comunidade28.
Essas
mudanças físicas apresentam barreiras sociais, podendo dificultar a
vida e interferir na autoestima e na qualidade de vida das pessoas
com lesão medular.
Em
estudo realizado com 35 pacientes, em que foi aplicado o instrumento
World Health Organization Quality of Life (WHOQOL) para avaliação
dos domínios físico, psicológico, relações sociais e meio
ambiente, observou-se diminuição significativa da qualidade de vida
no grupo estudado, em alterações dos domínios físico, psicológico
e de meio ambiente.
Os
autores concluíram que o aspecto físico tinha sido o mais atingido
e há evidências de que os domínios psicológico e de meio ambiente
permaneceram distantes das condições ideais esperadas para a
população em geral29.
Outro
estudo, que objetivou conhecer a percepção de qualidade de vida em
pessoas com lesão medular traumática com a utilização do
WHOQOL-BREF, contou com a participação de 111 indivíduos.
Quanto
à qualidade de vida, demonstrou-se que os domínios que refletiram
os piores escores de avaliação estavam relacionados ao meio
ambiente e à saúde física, e que os mais bem avaliados estavam
ligados à saúde psicológica e às relações sociais30.
Outras
evidências que sugerem que depressão e qualidade de vida
representam construtos diferentes estão relacionadas com a ausência
de sincronia de mudança entre os sintomas da depressão e a
avaliação da qualidade de vida.
A
redução dos sintomas depressivos não se traduz necessariamente em
melhora da qualidade de vida.
Em
pacientes distímicos, o alívio dos sintomas pode trazer melhora do
funcionamento social e ocupacional, mas o prazer envolvido em
atividades de lazer pode permanecer prejudicado31.
Em
um artigo de revisão, os autores sugerem que a presença de sintomas
depressivos exerce forte impacto na qualidade de vida dos sujeitos,
não se restringindo apenas às características clínicas do
transtorno.
Sendo
assim, a avaliação da qualidade de vida aparece como um desfecho
relevante, pois, pela sua multidimensionalidade, é potencialmente
capaz de detectar a magnitude e a abrangência do comprometimento que
a depressão impõe32.
Os
sintomas depressivos mais frequentes são os somáticos, entre os
quais destacam-se mudanças de humor e pensamento, falta de motivação
e concentração, tristeza, pessimismo, baixa autoestima, ansiedade e
comportamento suicida32,33.
Esta
pesquisa reforça a necessidade de redirecionar a atenção à saúde
dos indivíduos com lesão medular, buscando identificar, no
cotidiano dos serviços de saúde, seja nos hospitais ou
ambulatórios.
Programa
de Saúde da Família e outros, a presença de alterações na
qualidade de vida, na autoestima e na autoimagem, ansiedade e
depressão entre as pessoas que convivem no seu cotidiano com lesão
medular e com úlcera por pressão.
Deve-se
dar especial atenção às principais necessidades de cuidado e ao
conhecimento que o cuidador deve ter para lidar com as incapacidades.
Estudos
futuros devem ser conduzidos, visando à ampliação do tamanho da
amostra, em estudo multicêntrico e comparativo, buscando a
compreensão da magnitude do problema na vida desses sujeitos.
CONCLUSÕES
Metade
dos indivíduos portadores de lesão medular com úlcera por pressão
apresentou depressão, com sintomas leves a moderados e moderados a
graves, sendo os principais distorção da imagem corporal,
autodepreciação, retração social e ideia suicida.
Fonte:
- www.scielo.br
Sim a depressão na lesão medular é normal devido a mudança de vida de uma pra outra; a pessoa se vê num universo completamente diferente do qual estava acostumado onde tinha uma estrutura formada e estável; e assim de repente tudo desmorona a sua volta; por onde de agora em diante terá de reconstruir uma nova estrutura da estaca zero num ambiente completamente desconhecido sem saber o que encontrar pela frente, é onde vem o medo e a angústia se vai conseguir enfrentar e superar a dificuldades.
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