2ª parte
Movimento
político das pessoas com deficiência: reflexões sobre a conquista
de direitos.
Apesar
da fiscalização, de ações de esclarecimento e a aplicação de
multas, ainda há grande resistência dos empresários em contratar
trabalhadores com deficiência, por discriminação e por se
recusarem a tornar os ambientes de trabalho acessíveis.
Algumas
sentenças judiciais aceitam as justificativas dos empresários e
perpetuam a injusta exclusão das pessoas com deficiência.
O
direito à educação especial está assegurado na Lei 9.394/1996,
referente às bases da educação nacional, e prevê o atendimento
educacional especializado, com recursos pedagógicos específicos
para cada aluno com deficiência.
Em
2007, o MEC editou a Política de educação especial na perspectiva
da educação inclusiva, obedecendo à Convenção da ONU: sistema de
ensino inclusivo, com aula na classe comum e atendimento educacional
especializado em turno oposto, para garantir a inclusão com
qualidade.
São
exigidas: sala de recursos multifuncionais, instalações, mobiliário
e transporte escolar acessíveis, formação de professores para o
atendimento de alunos surdos na educação bilíngue e para o ensino
do sistema Braille aos alunos cegos ou com baixa visão, além de
material didático acessível (MAIOR, 2015).
Apesar
do avanço de escolarização das pessoas com deficiência nas
escolas regulares inclusivas, persiste a defesa das escolas especiais
principalmente para alunos com deficiência intelectual e múltipla,
pois parte da sociedade ainda considera o antigo modelo de
atendimento mais adequado e usa sua força política para persistir
segregada.
A
partir da recente Lei 13.409/2016, tornou-se obrigatória a reserva
de vagas para o ingresso de alunos com deficiência nas escolas
técnicas e nas instituições de ensino superior federais.
Espera-se
que essa medida reverta a insuficiente participação de estudantes
com deficiência e promova a cultura inclusiva nos nichos de formação
profissional e acadêmica.
A
Lei 8.742/1993 estabeleceu o atendimento da pessoa com deficiência
em diversos tipos de serviços da assistência social, tais como
residências inclusivas, modelo de moradia com apoios para a
autonomia e a vida independente na comunidade.
A
lei também define a concessão do benefício de prestação
continuada (BPC), no valor de um salário mínimo mensal, destinado
ao enfretamento da situação de extrema pobreza de vida de muitas
pessoas com deficiência.
A
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência,
homologada em 2006 pela Organização das Nações Unidas (ONU), é o
mais recente tratado internacional de direitos humanos e foi o
primeiro a contar com a voz dos movimentos sociais na fase de
elaboração (PAULA, 2008).
Sob
o lema Nada sobre nós, sem nós, o documento apresenta o conjunto de
medidas a serem cumpridas pela sociedade e pelos governos, com igual
responsabilidade, visando à justiça social advinda da equiparação
de oportunidades.
No
Brasil, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência
foi ratificada com base no § 3º do artigo 5º da Constituição,
incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004, passando a
marco constitucional.
O
Decreto Legislativo 186/2008 (BRASIL, 2008) ratificou-a e o Decreto
6.949/2009 promulgou a Convenção para efeitos internos (BRASIL,
2009).
É
a única convenção com status constitucional.
São
princípios da convenção: a autonomia, a liberdade de fazer as
próprias escolhas, a não discriminação, a participação e
inclusão, o respeito pelas diferenças e a pessoa com deficiência
como parte da diversidade humana, a igualdade de oportunidades, a
acessibilidade, a igualdade de gênero e o respeito pelo
desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência.
A
convenção estabelece a acessibilidade como princípio e como
direito básico para a garantia de todo e qualquer direito humano
(BEZERRA, 2014).
O
descumprimento da acessibilidade equivale à discriminação com base
na deficiência.
Não
existe liberdade de expressão sem as tecnologias de informação e
comunicação acessíveis, tal como não se realiza o acesso ao
trabalho sem respeito pela diferença, transporte e acomodações
acessíveis.
Devido
à força constitucional, a convenção condiciona todas as leis,
decretos e outras normas atinentes às pessoas com deficiência,
assim como aumentaram as obrigações do Estado, em todas as esferas
de governo, do segundo e terceiro setores, com ativa participação
da pessoa com deficiência e das famílias (MAIOR e MEIRELLES, 2010).
Tão
importante quanto a convenção é o seu Protocolo Facultativo, pois
se não forem suficientes as instâncias nacionais, o Comitê da
Convenção atuará no monitoramento e na apuração de denúncias de
violações dos direitos humanos, individuais e coletivos, oriundos
dos países signatários do documento opcional (PAULA e MAIOR, 2008).
Destaca-se
o artigo 1 da convenção, o qual reflete a adoção do modelo social
da deficiência:
Pessoas
com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as
demais pessoas.
Em
2015 foi sancionada a Lei 13.146, Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoa com Deficiência, com a proposta de alterar e complementar a
legislação aos comandos da Convenção da ONU.
A
ênfase no direito à acessibilidade, a garantia da educação
inclusiva, a concessão de tecnologia assistiva no âmbito da
reabilitação e da educação, a avaliação biopsicossocial da
deficiência, o cadastro-inclusão e o auxílio inclusão para
estimular a entrada no mercado de trabalho pelos beneficiários do
BPC são os passos a serem conquistados.
Também
a aplicação do reconhecimento igual perante a lei representa um
avanço legal ao determinar a alteração das medidas de interdição
existentes no Código Civil e a introduzir a tomada de decisão
apoiada para preservar a autonomia das pessoas com deficiência
intelectual e mental, principalmente.
Sabendo
que a sociedade brasileira ainda não reconhece a violência
praticada contra as pessoas com deficiência, para corrigir esse
quadro, a Lei 13.146/2015 dá ênfase ao enfrentamento da
discriminação de gênero e de outras maneiras da praticar
exploração, violência e abuso contra as pessoas com deficiência.
O
quadro requer medidas que apurem, impeçam, resgatem e apóiem as
vítimas e os agressores, especialmente quando são membros da
família ou cuidadores sem preparo emocional para a responsabilidade.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
O
movimento político das pessoas com deficiência no Brasil investe no
processo de mudança cultural há cerca de quatro décadas e alcançou
resultados expressivos de cidadania, partindo-se da tutela para o
alcance da autonomia, ao lado da elaboração de arranjos sociais que
lhes permitam exercer seus direitos em um contexto cada vez mais
próximo à vida independente.
Esse
caminho foi pavimentado com demandas das organizações da sociedade
civil capazes de fomentar a criação de leis, das políticas e de
órgãos governamentais incumbidos da promoção e defesa dos
direitos humanos desse segmento.
Com
a adoção dos conselhos e das conferências de direitos das pessoas
com deficiência, a fiscalização das políticas públicas de
inclusão passou a outro patamar, todavia não pode prescindir da
força intrínseca das associações de luta com capacidade de expor
suas ideias e discordar de medidas governamentais prejudiciais aos
seus direitos.
A
liberdade de expressão do movimento da sociedade civil é
indispensável para a manutenção das conquistas alcançadas.
Percebe-se
que a mobilização permanente das pessoas com deficiência serve de
base para existirem medidas de equiparação de oportunidades
implementadas pelos governos e pela própria sociedade.
Embora
as pessoas com deficiência cada vez mais ocupem espaços públicos,
como a escola, a fábrica, os palcos, as instituições culturais, os
pódios paralímpicos e estejam em cargos privados e governamentais,
há uma sub-representação das mulheres com deficiência e das
pessoas com deficiência intelectual, múltipla e transtorno do
espectro autista entre aquelas que estão incluídas.
Essa
situação acontece por discriminação, falta de oportunidades e de
apoios requeridos para sua autonomia e liberdade de fazer as próprias
escolhas.
Os
novos rumos do movimento das pessoas com deficiência precisarão
considerar as diferenças existentes internamente e investir na
capacitação de lideranças alinhadas com o paradigma dos direitos
humanos iguais para todos.
REFERÊNCIAS
BERMAN-BIELER,
R. Desenvolvimento Inclusivo: uma abordagem universal da deficiência,
equipe deficiência e desenvolvimento inclusivo da região da América
Latina e Caribe do Banco Mundial, 2005. Disponível em: . Acesso em:
26 jan. 2015.
BEZERRA,
R. M. N. Artigo 9. Acessibilidade. In: DIAS, JOELSON et al. (Orgs.).
Novos comentários à convenção sobre os direitos das pessoas com
deficiência. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República, Secretaria de Promoção dos Direitos da
Pessoa com Deficiência, 2014.
BRASIL.
Decreto Nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Disponível em: . Acesso
em: 22 jan. 2015.
BRASIL.
Lei 13.146 de 6 de julho , de 2017. Disponível em: . Acesso em: 12
ago. 2017.
CARVALHO,
L.; ALMEIDA, P. Direitos humanos e pessoas com deficiência: da
exclusão à inclusão, da proteção à promoção. Revista
Internacional de Direito e Cidadania, n.12, fev. 2012. Disponível
em: . Acesso em: 02 jul. 2017.
DINIZ,
D.; BARBOSA, L.; SANTOS, W. R. Deficiência, direitos humanos e
justiça. Sur, Rev. int. direitos human, São Paulo, v. 6, n. 11,
dec. 2009.
FIGUEIRA,
E. Caminhando em silêncio: uma introdução à trajetória da pessoa
com deficiência na história do Brasil. São Paulo: Giz Editorial,
2008.
FONSECA,
R. T. M. A ONU e o seu conceito revolucionário da pessoa com
deficiência, 2007. Disponível em: . Acesso em: 15 out. 2014.
GARCIA,
V. G. As pessoas com deficiência na história do Brasil. 2011.
Disponível em: . Acesso em: 22 Jun. 2017.
IBGE.
Censo Demográfico 2010: características gerais da população,
religião e pessoas com deficiência. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.
LANNA
JUNIOR, M. C. M. (Comp.). História do movimento político das
pessoas com deficiência no Brasil. Brasília: Secretaria de Direitos
Humanos, Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com
Deficiência, 2010.
LOPES,
L. F. Artigo 1: propósito. In: DIAS, J (Org.). Novos comentários à
convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência. Brasília:
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República,
Secretaria de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência,
2014.
MAIOR,
I. Deficiência e diferenças. São Paulo: Café Filosófico,
Instituto CPFL. Exibido em 19 jun. 2016. Disponível em: . Acesso em:
12 ago. 2017. Produzido por TV Cultura. Série O valor das diferenças
em um mundo compartilhado, de Benilton Bezerra Jr.
História,
conceito e tipos de deficiência. São Paulo: Secretaria de Estado
dos Direitos da Pessoa com Deficiência, 2015. Disponível em:.
Acesso em: 12 jun. 2017.
Breve
trajetória histórica do movimento das pessoas com deficiência. São
Paulo: Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência,
2015. Disponível em:
http://violenciaedeficiencia.sedpcd.sp.gov.br/pdf/
textosApoio/Texto2.pdf. Acesso em: 12 jun. 2017.
MAIOR,
I. L.; MEIRELLES, F. A Inclusão das Pessoas com deficiência é uma
obrigação do estado brasileiro. In: LICHT, F. B.
SILVEIRA,
N. (Orgs.). Celebrando a diversidade: o direito à inclusão. São
Paulo: Planeta Educação, 2010. Disponível em: . Acesso em: 18 jul.
2017.
ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório Mundial sobre a deficiência, 2011. São
Paulo: SEDPcD, 2012.
PAULA,
A. R.; MAIOR, I. M. M. L. Um mundo de todos para todos:
universalização de direitos e direito à diferença. Revista
Direitos Humanos. n.1, dez. 2008.
SÃO
PAULO (Estado). Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência.
Memorial da Inclusão. 30 anos do AIPD: ano internacional das pessoas
deficientes 1981-2011. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2011.
SASSAKI,
R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de
Janeiro: WVA Ed., 2003.
*Izabel
Maria Madeira de Loureiro Maior
Mestre
em Medicina Física e Reabilitação pela Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ). Professora aposentada da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro do Fórum UFRJ
Acessível e Inclusiva – Rio de Janeiro, RJ – Brasil. Conselheira
municipal e estadual dos direitos da pessoa com deficiência no Rio
de Janeiro – Rio de Janeiro, RJ – Brasil.
http://lattes.cnpq.br/7691713950451253
E-mail:
izabelmaior@hotmail.com
Submetido
em: 30/07/2017. Aprovado em: 10/09/2017. Publicado em: 03/12/2017.
Fonte:
http://revista.ibict.br/inclusao/article/view/4029
Acesse
aqui o livro e o documentário História do Movimento Político
das Pessoas com Deficiência no Brasil
Fonte: inclusive.org.br
Discriminar
pessoas com deficiência é crime.
A
sociedade tão apegada a estereótipos e padrões caminha a passos
lentos no que se refere a equidade e inclusão das pessoas com
deficiência.
Mesmo
que a causa seja apoiada por leis, tornam-se comuns os desafios que
esta parte da nossa população enfrenta diariamente.
Conforme
o último censo do IBGE realizado em 2010, aproximadamente 45
milhões de brasileiros possuem algum tipo de deficiência, o que
corresponde a 24% da população.
Diariamente
as pessoas com deficiência precisam transpor muitas barreiras e
frequentemente são discriminadas por terem seus direitos
desrespeitados no convívio em sociedade.
Acessibilidade
física, como rampas e elevadores, torna ambientes favoráveis para
locomoção de pessoas com mobilidade reduzida.
Acessibilidade
tecnológica permite que pessoas com baixa visão ou cegas utilizem
celulares e computadores com ajuda de softwares.
Já
na educação, os alunos com deficiência auditiva podem precisar de
intérpretes de LIBRAS para quebra de barreira comunicacional.
Além
da exclusão resultante das barreiras já citadas, a falta de
cultura inclusiva, ou seja, barreiras atitudinais, expõe a
população com deficiência às situações de constrangimento,
decorrentes do despreparo da sociedade para se relacionar com as
diferenças, limitações e possibilidades das pessoas com
deficiências.
40%
dos profissionais com deficiência que buscam oportunidades de
emprego no site Vagas.com já sofreram discriminação no ambiente
de trabalho, segundo pesquisa realizada pelo site em parceria com a
consultoria.
Talento
Incluir, em 2016 com a participação de 4.319 respondentes com
deficiência.
De
acordo com o relato da profissional com baixa visão, Herlândia
Suster, a pior barreira, certamente, é o preconceito atitudinal.
"Trabalhei
em uma empresa do segmento financeiro onde todas as minhas
necessidades de acessibilidade tecnológica foram atendidas, como
por exemplos software de aumento de tela e uma iluminação adequada
à minha deficiência, em meu posto de trabalho.”
Pensei
que a empresa estava preocupada e engajada para que minha inclusão
acontecesse de fato, porém, a gestão estava totalmente
despreparada no que diz respeito a relação humana, o que causou
dificuldade para o meu relacionamento com a equipe.
Eu
era resumida como a deficiente visual da área, duvidavam da minha
capacidade.
Eu
ocupava uma posição de Analista, porém, minhas atividades eram de
baixíssima complexidade, não era convocada para as reuniões de
equipe e a avaliação do meu desempenho era realizada sem dedicação
para cumprir formalidades".
Na
situação de discriminação vivida pela Herlândia, a
acessibilidade tecnológica foi atendida, mas não foi suficiente
para que ela tivesse sido plenamente respeitada no ambiente de
trabalho.
Para
conviver precisamos respeitar.
Como
podemos respeitar situações e condições que não conhecemos?
Informação
é o caminho para diminuir a distância entre as pessoas com
deficiência e a sociedade.
Segundo
Carolina Ignarra, sócia-fundadora da Talento Incluir: "o
preconceito é um comportamento inconsciente e inevitável que todos
os seres humanos levam 1/20 de segundos para formar.
Falar
sobre diferenças recheia de possibilidades o mindset coletivo e
torna o pré-julgamento mais aberto e livre de paradigmas".
Discriminação,
que é diferente de preconceito, também pode derivar da falta de
informação, mas é um comportamento negativo, formado por um baixo
nível de inteligência emocional, principalmente pela dificuldade
de se colocar no lugar do outro, ou seja, ser empático.
Para
favorecer a igualdade das pessoas com deficiência na sociedade,
atualmente discriminação é entendida como crime, previsto no
ART.88 da Lei 13.146/15 (LBI - Lei Brasileira de Inclusão).
Incluir
é uma ação consciente, que começa com o reconhecimento dos
rótulos que nos fazem julgar equivocadamente as diferenças,
evitando preconceito e discriminação.
A
disponibilidade e o interesse em buscar informações são atitudes
que concretizam a inclusão.
Fontes
- http://www.talentoincluir.com.br/
- terra.com.br
Toda manifestação é benéfica quando se vai de encontro a aqueles que desejam que seus direito sejam respeitados contra o preconceito, discriminação, violência e outros. Para isso há necessidade de leis que condene com punições severas aqueles que não as cumpram e assim defendas que precisa de sua proteção. Tudo isso porque o seu direito começa onde termina o dos outros, é fundamental que aja respeito.
ResponderExcluirApesar da lei de cotas no mercado de trabalho para o deficientes ainda há muita discriminação em relação a estes, muitas empresas criam setores para deficientes apenas para cumprir a lei e nada mais e os deixa de lado com trabalhos secundários e sem responsabilidade, não dão chance para que estes mostrem a sua capacidade laborativa infelizmente.
ResponderExcluir